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A condenação por ato de improbidade administrativa como causa de inelegibilidade

28/05/2014

por [Advogado] Guilherme Paiva Corrêa da Silva

"...cabe ao operador do direito zelar pela adequada aplicação da regra de regência, que pode acarretar o fim da carreira política do condenado por improbidade"

Em 2010, foi promulgada a Lei Complementar 135, que deu nova redação à Lei Complementar 64/90, criando novas hipóteses de inelegibilidades destinadas à proteção da probidade e moralidade administrativas no exercício do mandato, nos termos do art. 14, §9° da Constituição Federal.

Entre outras inovações, a referida LC 135/10, que recebeu a expressiva alcunha de Lei da “Ficha Limpa”, trouxe ao ordenamento jurídico nova causa de inelegibilidade decorrente de condenação por ato de improbidade administrativa decretada por órgão colegiado, independentemente do trânsito em julgado. Confira-se:

Art. 1º São inelegíveis: 
I - para qualquer cargo:
(...) l) os que forem condenados à suspensão dos direitos políticos, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, por ato doloso de improbidade administrativa que importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito, desde a condenação ou o trânsito em julgado até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena

Desde a sua aprovação, o dispositivo de lei suscitou relevantes discussões a respeito de sua conformação com a Constituição Federal, especialmente quanto a constitucionalidade da inelegibilidade decorrente de decisão judicial colegiada, com consequente afastamento do princípio da presunção de inocência.

O certo é que, em fevereiro de 2012, o Supremo Tribunal Federal, com duvidosa proficiência, declarou a constitucionalidade de todas as novas hipóteses de inelegibilidades criadas pela LC 135/10, encerrando a controvérsia que se instaurara naquela instância judicial.

Finalizada a discussão a respeito da incompatibilidade constitucional da nova hipótese de inelegibilidade, cabe ao operador do direito zelar pela adequada aplicação da regra de regência, que pode acarretar o fim da carreira política do condenado por improbidade.

Ressalte-se, nesse sentido, que a referida hipótese de inelegibilidade não decorre de qualquer condenação por ato de improbidade administrativa, é preciso antes que a decisão respectiva seja qualificada por certos elementos que justifiquem a especial restrição de direitos políticos imposta pela novel legislação.

Deveras, a configuração da nova causa de inelegibilidade depende de condenação à suspensão de direitos políticos por decisão transitada em julgado ou declarada por decisão de órgão colegiado, devendo a sanção ser respaldada em ato doloso de improbidade administrativa que importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito.
Parece-nos correto, portanto, que as decisões que não tratem da presença de todos esses requisitos e circunstâncias, nas condenações por improbidade administrativa, não devem atrair a incidência da inelegibilidade respectiva.

Saliente-se, no ponto, que a grave limitação da capacidade eleitoral passiva imposta pela lei impede tergiversações interpretativas com a finalidade de propiciar punições sistemáticas, sob pena de violação do princípio maior da soberania popular, segundo o qual todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição Federal.

No caso, diante da possibilidade de atuações impetuosas por parte de juízes e membros de tribunais, a nova hipótese de inelegibilidade deve ser aplicada com extrema cautela, de modo que o Judiciário não passe a tutelar a democracia representativa que constitui o âmago do nosso sistema político.