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O Tribunal do Júri no Brasil

31/08/2016

por [Advogado] Mariana Liza Nicoletti Magalhães

"...no Brasil, o Júri tem suas peculiaridades, como, por exemplo, só serão julgados os crimes dolosos contra a vida, ao passo que nos Estados Unidos a grande maioria dos litígios é julgado pelos Júri."

O Tribunal do Júri é essencial à estrutura do Judiciário brasileiro. Representa o direito à participação do povo na atividade jurisdicional estatal.

Há quem diga que o Tribunal do Júri é uma das mais democráticas instituições do Poder Judiciário, pois submete o homem ao julgamento de seus pares e não da Justiça togada. 

É um pouco parecido com o que é visto nos filmes americanos: são pessoas comuns com o poder de decidir o futuro do réu, baseados nas discussões acaloradas entre a acusação e a defesa, que se utilizam de forte apelo emocional.

Contudo, no Brasil, o Júri tem suas peculiaridades, como, por exemplo, só serão julgados os crimes dolosos contra a vida, ao passo que nos Estados Unidos a grande maioria dos litígios é julgado pelos Júri.

Inicialmente, o Tribunal do Júri no Brasil foi instituído pela Lei de 28 de junho de 1922 que limitava a sua competência para o julgamento dos delitos de imprensa.

Apenas em 1946, com a promulgação da Carta Magna, é que se estabeleceu a soberania dessa instituição com as seguintes características: número ímpar de jurados, sigilo das votações, a plenitude de defesa, soberania dos veredictos e a competência exclusiva para julgar os crimes dolosos contra a vida.

Atualmente o Júri está estabelecido no artigo 5º, XXXVIII da atual Constituição Federal, como direito e garantia individual e, portanto, cláusula pétrea. 

Os princípios basilares dessa instituição são:

a) a plenitude da defesa. Através desse princípio é garantido ao defensor o amplo acesso às provas e sua produção, relativizando, se necessário for, a forma e os prazos processuais.

b) o sigilo das votações. É a exceção no trâmite processual, pois a regra é a publicidade dos atos processuais. No caso do Tribunal do Júri, busca-se resguardar a serenidade dos jurados longe do público. Seria como que uma publicidade restrita – e não um ato secreto – pois permite a imparcialidade do jurado na solução de cada quesito. 

c) a soberania dos veredictos. É a forma de assegurar o efetivo poder jurisdicional, com o acatamento da decisão popular quanto ao mérito do julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

d) a competência para os crimes dolosos contra a vida. Ou seja, quando há intenção, excluindo-se assim, as modalidades culposas. Não basta, portanto, que a conduta resulte em morte da vítima, ainda que causada dolosamente, se não classificada como dolosa contra a vida – por exemplo, no caso de latrocínio. Essa reserva de competência leva em conta o mais relevante dos bens jurídicos (vida), enaltecendo-se, assim, a instituição popular. A competência, contudo, não é exclusiva, pois perfeitamente possível que o Tribunal do Júri conheça e julgue outros crimes que não dolosos contra a vida, desde que tenha conexão com o bem jurídico predominante.

Assim, o Tribunal do Júri é composto pelo Juiz Presidente (juiz togado) e pelo Conselho de Sentença (sete jurados leigos).

O Juiz Presidente deve conduzir todo o procedimento e lavrar a sentença final, após as conclusões apresentadas pelos jurados, por meio de respostas aos quesitos formulados sobre as questões de fato e de direito.

Os jurados são cidadãos maiores de 18 (dezoito) anos, de notória idoneidade, previamente alistados, que, na qualidade de juízes de fato, deverão decidir, sob juramento, de acordo com sua consciência e os ditames da justiça. 

O procedimento do Júri é escalonado. A primeira fase se inicia com o oferecimento da denúncia e se encerra com a sentença de pronúncia – conhecida como judicium acusationis; Já a segunda fase é o julgamento no Plenário, que envolve toda a organização do Júri – judicium causae.

O serviço do júri é obrigatório.

O artigo 425 do Código de Processo Penal determina que anualmente serão alistados pelo Presidente do Tribunal do Júri de 800 (oitocentos) a 1.500 (mil e quinhentos) jurados nas comarcas de mais de 1.000.000 (um milhão) de habitantes, de 300 (trezentos) a 700 (setecentos) nas comarcas de mais de 100.000 (cem mil) habitantes e de 80 (oitenta) a 400 (quatrocentos) nas comarcas de menor população. 

O Tribunal do Júri, nos termos do artigo 447 do diploma processual penal, é composto por 1 (um) juiz togado, seu presidente e por 25 (vinte e cinco) jurados que serão sorteados dentre os alistados, 7 (sete) dos quais constituirão o Conselho de Sentença em cada sessão de julgamento.

De acordo com o artigo 473 do Código de Processo Penal, prestado o compromisso pelos jurados, será iniciada a instrução plenária quando então o juiz presidente, o Ministério Público, o assistente, o querelante e o defensor do acusado tomarão as declarações do ofendido, se possível, e inquirirão as testemunhas arroladas. Os jurados também poderão formular perguntas ao ofendido e às testemunhas, por intermédio do juiz presidente. Em seguida, o acusado será interrogado.

Encerrada a instrução, serão realizados os debates e após o Conselho de Sentença será questionado sobre a matéria do fato, sobre a autoria e a participação, se o acusado deve ser absolvido, se existe causa de diminuição de pena e se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena.

A resposta negativa de mais de três jurados aos dois primeiros quesitos (autoria e materialidade) encerra a votação e implica em absolvição do acusado. Por outro lado, respondidos afirmativamente por mais de três jurados esses mesmos quesitos será formulado novo quesito com a seguinte redação: “O jurado absolve o acusado?”

Se negativa a resposta, segue-se na quesitação, indagando-se sobre os demais quesitos.

Os jurados não poderão manifestar sua opinião sobre o caso nem entre si muito menos com terceiros, em razão da regra da incomunicabilidade.

As decisões no Tribunal do Júri são tomadas por maioria de votos.

Encerrada a votação, o presidente profere a sentença que é lida em plenário.