» Mais Artigos

A responsabilidade do sócio minoritário não administrador em caso de desconsideração da personalidade jurídica de sociedade limitada

28/10/2021

por [Advogado] Fernando Corrêa da Silva Filho

"Exposta a divergência jurisprudencial, chama-se a atenção para o risco que corre o sócio minoritário meramente formal em relação à sua responsabilização por eventuais obrigações da sociedade..."

O Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos da FGV Direito SP, em outubro de 2014, divulgou brilhante estudo sobre o perfil das empresas que desenvolviam sua atividade à época sob o tipo de sociedade limitada, denominado Radiografia das Sociedade Limitadas[1].

Referido trabalho apurou a existência de 22,45% de sociedades limitadas nas quais o sócio controlador era titular de 99% ou mais das cotas do capital social e a existência de 24,32% das limitadas com um controlador titular de 75% até 98,99% do capital social.

Diante do relevante número de empresas dotadas de um sócio controlador, surge sempre a dúvida a respeito dos limites da responsabilidade do sócio minoritário em caso de desconsideração da personalidade jurídica da sociedade.

A esse respeito, a jurisprudência do E. Tribunal de Justiça de São Paulo diverge no sentido de responsabilizar todos os sócios, independentemente da participação no capital social, e de responsabilizar única e exclusiva do sócio controlador que exerce a administração da sociedade.

Considera a corrente favorável ao atingimento de todos os sócios que não há restrição legal, notadamente o artigo 50 do Código Civil, a limitar a execução contra um ou outro detentor de quotas do capital social da empresa. A esse respeito:

“Para os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica, não há fazer distinção entre os sócios da sociedade limitada. Sejam eles gerentes, administradores ou quotistas minoritários, todos serão alcançados pela referida desconsideração” (REsp 1250582/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 12/04/2016, DJe 31/05/2016)”;

“AGRAVO DE INSTRUMENTO LOCAÇÃO DE IMÓVEL CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA Inclusão de sócio minoritário Possibilidade Ausência de distinção quanto ao sócio majoritário. RECURSO PROVIDO. (TJSP; Agravo de Instrumento 2168447-19.2020.8.26.0000; Relator (a): Antonio Nascimento; Órgão Julgador: 26ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 13ª Vara Cível; Data do Julgamento: 11/05/2021; Data de Registro: 11/05/2021)”;

“Desconsideração da personalidade jurídica – Efeitos que atingem todos os sócios da empresa, inclusive os minoritários – Inexistência de limitação da responsabilidade às quotas sociais – Análise da jurisprudência – Decisão reformada para inclusão da sócia minoritária no polo passivo da execução – Recurso provido.* (TJSP; Agravo de Instrumento 2241295-72.2018.8.26.0000; Relator (a): Souza Lopes; Órgão Julgador: 17ª Câmara de Direito Privado; Foro de São José dos Campos - 7ª Vara Cível; Data do Julgamento: 07/12/2018; Data de Registro: 07/12/2018)”.

Já a corrente favorável à limitação dos efeitos da responsabilização apenas ao sócio controlador defende que, inexistindo prova da participação e do benefício do minoritário que não exerce a administração nos atos fraudulentos justificadores da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, não há como se estender a ele a responsabilidade pelas obrigações da sociedade por força da parte final do mesmo artigo 50 do Código Civil. A propósito:

“Na legislação pátria, todavia, adotou-se, como regra geral, a Teoria Maior da Desconsideração, segundo a qual a mera demonstração de estar a pessoa jurídica insolvente para o cumprimento de suas obrigações não constitui motivo suficiente para a desconsideração da personalidade jurídica. Exige-se, portanto, para além da prova de insolvência, ou a demonstração de desvio de finalidade, ou a demonstração de confusão patrimonial. Assim, em virtude da adoção da Teoria Maior da Desconsideração, é necessária a comprovação do desvio de finalidade ou a demonstração de confusão patrimonial. É necessário, portanto, comprovar que alguém via de regra, um gerente ou administrador, praticou ato reconhecido como fraudulento ou abusivo. (...). De fato, em que pese não existir qualquer restrição no art. 50 do CC/02, a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica apenas deve incidir sobre os bens dos administradores ou sócios que efetivamente contribuíram na prática do abuso ou fraude na utilização da pessoa jurídica, devendo ser afastada a responsabilidade dos sócios minoritários que não influenciaram na prática do ato” (REsp nº 1.315.110-SE, registro nº 2011/0274399-2, 3ª Turma, v.u., Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, j. em 28.5.2013, DJe de 7.6.2013)”;

“Agravo de instrumento Desconsideração da personalidade jurídica Sócio minoritário e sem poderes de administração, que se retirou da empresa antes da fase de execução, e que foi incluído no polo passivo da demanda Constatação do oficial de justiça de que a empresa está funcionando regularmente - Eventuais atos de insolvabilidade da sociedade comercial que não podem ser imputados ao sócio minoritário, a fim de responder com bens particulares, quando não dispunha de poderes para tanto. Provimento para excluir o agravante do polo passivo” (TJSP; Agravo de Instrumento 2216205-96.2017.8.26.0000; Relator (a): Enio Zuliani; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Privado; Foro de Piracicaba - 1ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 05/04/2018; Data de Registro: 06/04/2018)”;

“DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. INCLUSÃO DO SÓCIO MINORITÁRIO NO PÓLO PASSIVO DA EXECUÇÃO. 1. Com relação à desconsideração da personalidade jurídica, somente cabe responsabilizar o sócio com poderes de administração, não demonstrada a participação do sócio minoritário no ato irregular que ensejou a adoção da medida excepcional. 2. E a credora não indicou nenhum ato praticado pela agravante que justificasse sua inclusão na lide. 3. Recurso provido” (TJSP; Agravo de Instrumento 2250711-98.2017.8.26.0000; Relator (a): Melo Colombi; Órgão Julgador: 14ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional II - Santo Amaro - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 06/03/2018; Data de Registro: 06/03/2018)”.

Exposta a divergência jurisprudencial, chama-se a atenção para o risco que corre o sócio minoritário meramente formal em relação à sua responsabilização por eventuais obrigações da sociedade, assim como o risco do sócio que não exerce os seus direitos, mesmo como minoritário, na fiscalização das atividades da empresa e outras medidas cabíveis para a proteção de seus direitos.

 

[1] Ary Oswaldo Mattos Filhos, Maurício Chavenco, Paulo Hubert, Renato Vilela e Victor B. Holloway Ribeiro. Radiografia das Sociedades Limitadas. Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos – FGV Direito SP (Outubro de 2014).